01 julho 2008

Certas ciladas da Igualdade

Quando o sociólogo francês Bourdieu disse que, na Escola, desiguais devem ser tratados como desiguais, deu-nos um recado muito importante: tratar-nos formalmente como iguais tendo nós origens bastante distintas, e ainda, valorizarmos dons e resultados individuais, sendo nós desiguais em condições, é reproduzir uma sociedade que enfatiza e hierarquiza diferenças, escondendo a distinção do que vale mais no discurso formal e normativo de respeito à diversidade, ou se você preferir, da suposta igualdade perante a lei e ao tratamento. Não é difícil lembrar das próprias experiências para comprovar que a Escola é absolutamente assim, nem se precisa de muita correlação para concluir que uma sociedade que assim o faz, além de objetivamente injusta, é essencialmente hipócrita.
Por sua vez, o grosso da teoria socialista, a começar por Marx, diz que sociedade justa é sociedade sem interesse de classes, de igualitariedade de condições em todos os campos e em todos os sentidos. Assim, desdobrando a teoria à atualidade, seria uma sociedade que visa eliminar desigualdades estruturais e “estruturantes”, ao mesmo tempo em que possibilita-nos o pleno exercício da diversidade. Todos diferentes, vistos como diferentes, diversos, mas nunca desiguais em possibilidades.
No ocidente, temos a igualdade formal, liberal, em uma sociedade que valoriza o mérito, o esforço e conquista individual, meios ideais para o cultivo da competitividade capitalista, e é claro, graças à isonomia e ao discurso da diversidade que dela se correlaciona, temos desigualdades em muitas esferas sem o ônus dos conflitos que o escancaramento destas desigualdades deveria gerar.
A direita se constrói mergulhada nessas diferenças expostas e desigualdades camufladas. O sociólogo Flávio Pierucci dá uma boa dica para se pensar a direita, para estas pessoas “a ilusão do sensível encaixa à construção do perceptível”, ou seja, na direita segregamos as partes do mundo baseados no que percebemos com os sentidos, e tomamos isso como base de nossas verdades. Homens e mulheres são iguais perante a lei, mas tidos como visivelmente diferentes, tratados de maneira desigual, desigualdades baseadas nessas diferenças aparentes. Os debates sobre isso na mídia passam longe da discussão sobre o gênero; na tela da TV, bem como nas mesas de bar, diferenças entre homem e mulher são dadas, biologizando uma questão que é essencialmente social.
Para ficar mais fácil, trace uma reta. Infinita. Para a esquerda desta reta temos a direção de uma igualdade plena, utópica, abstrata, e tão simetricamente dada, que todos os seres nela podem ser absolutamente diferentes sem que nenhuma diferença incorra em desigualdade de qualquer natureza. Em outras palavras um extremo de sociabilidade, uma diversidade plena, mas concomitada e concomitante à igualitariedade absoluta. Então, fica tudo aparentemente simples. Quando mais perto disto, mais à esquerda, quando mais longe, mais à direita. Certo? Errado!
Se as coisas só dependessem deste referencial para entrar na reta, Jesus estaria mais a esquerda que Che Guevara, já Maluf e Hebe estariam próximos de Hitler. Ainda que o último caso me agrade, a idéia não é boa o bastante para explicar-nos o dilema.
A posição na reta só pode ser pensada de acordo com a predisposição de subversão da ordem social (tradição, conservadorismo, estamentos, senso comum, hierarquias, democracia majoritária e formal, enfim) em prol de maior aproximação do ideal de igualitariedade. Nesse sentido quase tudo que conhecemos está à direita. Como o ideal de igualdade é abstrato, difuso, e tende ao infinito, além dessa rebeldia fundamental, uma crítica constante as próprias percepções e especulações são pré-requisitos indispensáveis para a esquerda em qualquer posição.
Em suma, o texto é prescritivo: a defesa desenfreada da diversidade por parte da direita mascara desigualdades que a própria direita fomenta. A defesa desenfreada da diversidade por parte da esquerda também é perigosa, porque ela deve ser desejosa de uma igualitariedade de condições, e não de existência, e em tempo, defender a diversidade não é defender uma igualitariedade que permita a coexistência pacífica e justa de um mundo diverso.

Stevens Beringhs

2 Comentários:

disse em 3/7/08 23:41, Anonymous Anônimo

Eu sempre leio aqui também!
Talita

 
disse em 24/8/08 22:58, Anonymous Anônimo

É Stevens mandou bem!!!Hoje fala-se tanto em igualdade de direitos e diversidade que as vezes não paramos para pensar no quão subjetivos são tais conceitos. São as elites, os conservadores os que mais fazem alarde em torno da defesa da igualdade sendo que são os mesmos que mais a sustentam. Não devemos nos esquecer também que os primeiros a levantar a bandeira da igualdade do homem, os burgueses revolucionários do séc XVIII, eram a elite comercial da Europa e lutavam pela "igualdade entre os seus iguais" ou seja, igualdade pra o burguês... que igualdade é essa então da qual tanto falamos e pouco entedemos????
Quer saber de uma coisa??? Igualdade coisa nenhuma!!!!;somos todos únicos e devemos ser tratados ,acima de qualquer igualdade, com respeito!

 

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